terça-feira, 8 de junho de 2010

A Inquisição em Portugal

UMA PARTE DA NOSSA HISTÓRIA - PARA RECORDAR

No dia 3 de Junho de 2010, celebrou a Igreja Católica o dia do “Santíssimo Corpo de Deus”, com a pompa e circunstância que lhe é habitual, em honra daquele que sempre, viveu dentro dos parâmetros de humildade, CRISTO e que veio a morrer pregado numa cruz feita de um qualquer tronco de arvore. Era judeu e, como tal já os Romanos os tentavam aniquilar, tinham receio do seu poderio económico e da sua unificação como um estado independente. O povo hebraico foi sobrevivendo ao longo dos séculos e, contra tudo e todos, lá foram mantendo a sua crença religiosa impune até aos nossos dias.
Quando é que os Judeus se estabeleceram em Portugal? Quem tiver acesso à Revista Panorama, 1º vol., nº 3, de 20 de Maio de 1837, encontra lá um esplêndido artigo acerca dos «Judeus em Portugal». Também quem ler o Tomo 1 da “História da Origem e Estabelecimento da Inquisição em Portugal” de Alexandre Herculano, encontrará no final do volume, em «Apêndices», a reprodução do referido artigo e do qual vou transcrever algumas partes.
«Acerca do tempo em que os judeus entraram nas Espanhas há várias opiniões. Fazem alguns remontar a vinda dos primeiros ao tempo da conquista da Palestina por Nabucodonosor, outros afirmam que eles começaram a frequentar nossos portos por via de comércio no tempo dos Macabeus; pretendem outros, enfim, que foi depois da ruína de Jerusalém por Tito, quando os dispersaram pelo mundo, que muitos deles vieram fazer assento nas Espanhas. Seja o que for, é certo que no tempo dos Godos um grande número de famílias hebreias se achavam estabelecidas neste país. Durante o domínio dos Godos correram os judeus vária fortuna; mas a maldição de Deus, que sobre eles pesava, não os deixou respirar por largo tempo debaixo de afrontas e opressões. Nas leis góticas se encontram muitas tendentes a oprimi-los e a conservá-los na inferioridade a respeito dos cristãos. Desde a entrada dos Árabes a sua sorte parece ter melhorado algum tanto, não porque o maometismo fosse mais tolerante do que o cristianismo, mas porque os príncipes sarracenos eram mais ilustrados do que os godos. Foi nesta época que os judeus cresceram em número e em riqueza, vivendo em boa harmonia com os dominadores árabes e com os cristãos vencidos
«…Parece que a primeira perseguição contra os judeus de Espanha foi tentada por Pedro, abade de Cluny, quando veio a Castela, em tempos de Afonso VII; porém esta perseguição não chegou a efectuar-se; porque há memórias de terem os judeus vivido tranquilamente durante o reinado deste príncipe. Daí avante a raça hebraica foi pouco a pouco florescendo em Espanha. As riquezas por ela possuídas, os talentos e instrução de muitos judeus, tanto mais notáveis quanto maior era a ignorância e barbárie daqueles tempos, lhes abriram o caminho das honras e do poder. Em geral, os diferentes reis da Península, achando nesta casta, menoscabada pelos nobres e pelo povo, o conselho e os socorros pecuniários, que nem naqueles nem neste encontravam, rodeavam o trono de homens inteligentes e activos, posto que odiados, e lhes confiavam os cargos mais importantes do Estado. Esta preferência, dada à nação hebraica, ainda pelos príncipes mais religiosos, era tal, que os hereges, que pretendiam, sem correr risco, propagar seus erros, se vestiam de judeus, e assim ficavam seguros de não serem molestados. Frei Afonso de Espina, no livro que intitulou Fortalitium Fidei, lamenta a grande entrada e valimento que os judeus tinham nas cortes dos reis
«…Este valimento que os judeus tinham em Castela também o alcançaram em Portugal logo no princípio da monarquia. Em uma decretal de Gregório IX é repreendido D. Sancho II por favorecer os judeus, e se ordena ao mesmo tempo aos bispos de Astorga e Lugo o admoestem para emendar este abuso. Ordenou além disso o papa que, no caso que os exactores das rendas públicas fossem mouros ou judeus, houvesse um superintendente cristão, que vigiasse e acudisse às vexações que eles faziam ao clero, e com que naturalmente se vingavam das injúrias que do clero recebiam. No tempo de D. Dinis, em uns artigos de queixa feita em Roma pelos eclesiásticos contra este príncipe, foi ele arguido de dar os lugares de fazenda aos judeus e de, afora isso, lhes permitir andarem sem divisas nem sinais, por onde fossem conhecidos, segundo nos cânones era estabelecido; acrescentando o isentá-los das dízimas eclesiásticas; o que prova quão favorecidos eles foram no reinado daquele piedoso, mas político e assisado, monarca
Se os judeus, desde o reinado de D. Afonso IV, eram obrigados a trazer sinais por onde fossem conhecidos, e como tal tinha caído em desuso, D. João I , ordenou que trouxessem uma divisa vermelha da feição de uma estrela, não só sobre o peito, mas também sobre roupas externas, ou capas, com que podiam encobrir a que traziam pregada no vestido. Estes sinais vigoraram até ao reinado de D. Manuel I. Não obstante a obrigação de usarem estes sinais, eram obrigados a viveram em bairros próprios, as judiarias, dentro das cidades, que eram fechados e com guardas nas entradas.
«Assim viveram os judeus em Portugal durante uns poucos de séculos; mas a época em que esta desgraçada nação devia sofrer todos os horrores de uma perseguição bárbara e atroz chegou enfim com o reinado de D. Manuel. Este príncipe, no começo do seu governo, mostrou-se generoso com os judeus espanhóis, que estavam cativos em Portugal, libertando-os e dando-lhes licença para saírem do reino; mas breve mudou de procedimento, e deixou, pelo que dali a pouco teve com os judeus em geral, a mais negra página das muitas desta cor que há em sua história
Fernando e Isabel de Castela, os reis católicos, e em tempos do nosso rei D. João II, tinham os judeus mandados despejar a Espanha em certo prazo, sob pena de morte, só para Portugal vieram mais de cem mil, com condições de saírem do reino em tempo determinado ou ficarem escravos da coroa.
«Entretanto parece que a Espanha conheceu o erro que tinha cometido em expulsar do seu seio uma raça laboriosa e possuidora de grandes riquezas; mas o passo estava dado, e então só restava aniquilar as vantagens que Portugal podia tirar da falsa política dos reis de Castela. Assim, estes requereram por cartas a el-rei D. Manuel fizesse o mesmo em seus reinos, ao que ele acedeu por sugestões de alguns dos seus conselheiros, talvez por isso peitados, ou movidos pelo espírito da intolerância religiosa daqueles tempos. O modo que se teve em executar esta resolução foi horrível. Presos por diversos laços à terra que lhes dera o berço, muitos judeus abjuraram a sua crença, ao menos fingidamente; outros mais tenazes preferiram o desterro; mas, além do desterro, maior calamidade se lhes acrescentava. Ordenou el-rei que todos os filhos dos judeus que saíam, que tivessem menos de catorze anos, lhes fossem tomados para se criarem no cristianismo. Faz eriçar os cabelos o ler em Damião de Góis a descrição desta cena cruel, em que a tirania tirava a última consolação àquela raça desventurada. Alguns cristãos-velhos, compadecidos da aflição e lágrimas destes infelizes, lhes escondiam as crianças, para depois lhas restituírem. Muitos pais e mães pegavam em seus próprios filhinhos e os lançavam em poços e rios, ou os acabavam por outro modo, para os não entregar aos seus opressores; e a desesperação chegou a tal ponto, que alguns se matavam para não passarem por esta separação dolorosa
Estava instituída a Inquisição e quem ousasse escrever ou pronunciar uma palavra de justiça em favor de homens que não criam em Deus pela forma que estava prescrita no Directório de Inquisidores de Nicolau Eimerico, só lhes restava o fundo de um calabouço. É desta instituição horrível, filha do fanatismo religioso, o que nos relata António José Saraiva, no seu livro “Inquisição e Cristãos-Novos”, pág.49:
«Não faltou quem se encarregasse de estimular e organizar esta transferência do ódio ao Judeu para o Cristão-novo. Acima de todos, os pequenos clérigos em que se distinguiram os frades dominicanos. Eles desempenham em Portugal com em Espanha um papel decisivo no desencadeamento dos pogromes. Tal como em 1449, são eles que estão à frente da matança iniciada em 19 de Abril de 1506 em Lisboa. No decorrer de uma cerimónia religiosa na igreja de S. Domingos, um homem que participava no culto, no momento em que o povo gritava «milagre» à vista de um resplendor que saía do crucifixo, teve a ideia inoportuna de argumentar que se tratava apenas do reflexo de uma vela. Foi logo taxado de «Cristão-novo», morto e queimado in loco. Dois frades dominicanos brandindo crucifixos excitaram os fiéis aos gritos de «heresia, heresia!». Durante três dias a cidade esteve nas mãos dos amotinados, que pilhavam as casas, atiravam mulheres e crianças da janela à rua e acendiam por toda a parte fogueiras onde ardiam vivos e mortos
Foi esta a lei que vigorou até ao século XVIII–XIX, foi interrompida por alguns anos, mas desde 1928 até 1974, ela foi restabelecida, mediante a colaboração da maior parte da nossa igreja e, como antigamente, lá estava o lápis azul da censura, lá estava a policia politica (DGS/PIDE), a torturar e a desterrar para Peniche, Tarrafal e outras prisões, quem não dissesse «ámen» com o regime estabelecido. Não vou falar nos dias de hoje, pois os escândalos que se abatem sobre a igreja são tantos e de tanta espécie, que todos aqueles que quiserem estar informados de tal é só lerem os jornais diários, consultarem as notícias através da Internet, ou assistirem aos telejornais dos diversos canais de televisão, só não está informado quem não quiser!

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