quarta-feira, 23 de junho de 2010

Considerações sobre a história local - Paços de Brandão (XIII)

IDADE MÉDIA – ATÉ AO SÉC. XIV – XV (TERRAS DE SANCTA MARIAE - 2)


Corografia Portugueza – DA COMARCA, & OUVIDORIA DA FEYRA
O Pde. António Carvalho da Costa, em «Corografia Portugueza», tomo primeyro, Tratado IV, páginas 164 a 177, faz-nos a descrição, «DA COMARCA, & OUVIDORIA DA FEYRA». Esta obra foi editada no ano de M.DCC.VI, e oferecida, pelo autor, a «ELREY D. PEDRO II». É desta obra que vou transcrever algumas partes, por me parecerem de todo o interesse, para uma melhor compreensão do assunto de que se está a tratar:
CAPÍTULO I – Faz-nos a descrição da «VILLA DA FEYRA»
Cinco léguas da Cidade do Porto para a parte do Sul e duas do mar oceano para Nascente, entre os dois celebrados rios Douro e Mondego, quase em igual distância de um e do outro, em um ameno e salutífero vale, tem seu assento a nobre Vila da Feira, que povoarão pelos anos de 990; o Duque Mem Guterres e o Conde Mem Lucidio, juntamente com os senhores de Marnel, todos muito chegados em parentesco aos Reis de Leão, donde se chamarão INFANÇOENS antigos de Santa Maria, como se chama toda esta terra, de que foram senhores os Condes da Feira, que por muitos anos morarão no seu Castelo, que está em lugar iminente e foi fundação dos Mouros. Tem 250 vizinhos com uma Paróquia, que é Convento dos Cónegos Seculares da Congregação de São João Evangelista, que fundou Dom Diogo Forjaz Pereira, quarto Conde da Feira, mo ano de 1560. É da invocação do Espírito Santo, cuja Igreja é de uma só nave, mas muito grande em forma prolongada, com Capela-mor toda de «jaspes», e mármores finíssimos, lavrados de obra dórica às mil maravilhas. Tem embutidos nas paredes dois túmulos de alabastros brancos, vermelhos e negros, e no pavimento um «carneyro», onde se enterrarão os senhores desta casa. É Abade desta Igreja o Reitor, e o Sacristão costuma ser o Vigário: Tem Casa de Misericórdia, Hospital e estas Ermidas, S. Nicolau, que era antigamente a Matriz, N. Senhora de Campos, N. Senhora da Encarnação situada no Castelo, (cuja Ermida é de cantaria sextavada «cantaria talhada em forma sexangular», e tem notáveis relíquias de Santos), São Francisco, Santo André, Santa Margarida, Santa Luzia, o Arcanjo São Miguel , e outra a Todos os Santos.
É esta Vila abundante de todos os frutos, caça, gado, carne de porco, linho, lenha, e de regalado peixe. Assistem ao seu governo civil um Ouvidor Letrado, que representava os Condes desta Vila, três Vereadores, um Procurador do Concelho, Escrivão de Câmara, um Juiz de Órfãos com seu Escrivão, e «Porteyro», quatro Tabeliães do judicial, e «Notas», Distribuidor, Inquisidor, e Contador, um Meirinho, um Alcaide, que é da Provedoria de Esgueira. Ao militar, um Capitão-mór, Sargento-mór com treze Companhias de Ordenanças da Vila, e seu termo, que é muito dilatado, e consta da Freguesias seguintes: (Segue-se a descrição das freguesias, que abrange vastíssimo território, desde Vila Nova de Gaia até Oliveira de Azeméis, Ovar, Esgueira, Vila Pereira de Juzã, Vila de Cambra, e a Vila de Castanheira, no Bispado de Coimbra).
CAPÍTULO II – Trata dos CONDES DA FEIRA
Foi Senhor desta Vila, o Conde Dom Fernando Forjaz Pereira Pimental, cuja ilustre Varonia e ascendência é a seguinte:
- Dom Álvaro Pereira, filho segundo de Dom Rui Gonçalves Pereira, foi Marechal deste Reino, senhor da Vila da Feira, e de outras muitas terras, o qual contava um grande número de ilustres avós: casou com Dona Mecia Vasques Pimental, filha de Vasco Martins Pimentel, chamado o Patinho, de que teve, entre outros filhos:
- João Álvares Pereira, que foi senhor da Casa de seu pai; casou com Dona Leonor Gonçalves, filha de Gonçalo Vaz de Mello, o Velho, de que teve, entre outros filhos:
Fernão Pereira, que foi senhor da Casa de seus pais e casou com Dona Isabel de Albuquerque, filha de Pedro Vaz da Cunha, senhor da Vila de Angeja, de que teve filhos, Rui Pereira e outros, que morreram moços; casou segunda vez com Dona Isabel de Berredo, filha de Dom Gonçalo Pereira, de que teve a Dona Isabel de Berredo, e a Galiope Pereira.
Rui Pereira, filho de Fernão Pereira, foi senhor da Casa de seus pais, e avós, e se chamou Conde da Feira: casou com Dona Leonor de Berredo, filha de Dom Gonçalo Pereira, e de Maria de Miranda, de que teve, entre outros filhos:
- Dom Diogo Pereira, que foi senhor de Besteiros, e Segundo Conde da Feira, por mercê de El-Rei Dom Manuel feita na Vila de Almeirim a 2 de Janeiro de 1515. Casou com Dona Beatriz de Castro, filha de Dom João de Noronha “o Dentes”, e de Dona Joana de Castro, de que teve, entre outros filhos:
- Dom Manuel Pereira, que foi Terceiro Conde da Feira, e senhor das mais casas de seu pai: casou com Dona Isabel de Castro, filha de D. João de Menezes, primeiro Conde de Tarouca, e de Dona Joana de Vilhena, de que teve, entre outros filhos:
- Dom Diogo Pereira, que foi Quarto Conde da Feira: casou com Dona Ana de Castro, sua prima co-irmã, filha do Regedor João da Silva, e de D. Joana de Castro, de que teve, entre muitos filhos:
- Dom Manuel Pereira, que morreu em vida de seu pai, e foi casado com Dona Joana da Silva, filha de Dom João de Menezes, senhor de Cantanhede, e de Dona Margarida da Silva, de que teve D. Diogo Pereira e D. João Pereira.
- Dom Diogo Pereira, filho de D. Manuel Pereira, foi Quinto Conde da Feira, e herdou a casa de seu avô o Conde D. Diogo Pereira: casou com Dona Iria de Brito, filha de João Brito, da qual não teve filhos; foi morto em Madrid por desastre estando em casa.
- Dom João Pereira, irmão deste Conde D. Diogo Pereira, herdou a Casa de seus pais, e avós, e foi o Sexto Conde da Feira, e General da Armada do Consulado pelos anos de 1594; e morreu no ano de 1618, indo por Vice-Rei para a Índia: casou com D. Maria de Gusmão, filha de D. Rui Gonçalves da Câmara, primeiro Conde de Vila Franca, e de D. Joana de Blaesoet, de que teve:
- Dona Joana Pereira, que casou com Dom Manuel Pimentel, filho de Dom João Afonso Pimentel, oitavo Conde de Benavente em Castela, e Vice-Rei de Nápoles, e da Condessa Dona Mecia de Zuriga e Requezens, filha de Dom Luís de Requezens, Comendador-Mór, e Governador da Flandres: este Manuel Pimentel foi Sétimo Conde da Feira por sua mulher, de quem teve Dom João Pereira Forjaz, Dom Fernando Forjaz Pereira Pimentel, e a Dona Joana, primeira mulher de D. João da Silva, segundo Marquês de Gouveia.
- Dom João Pereira Forjaz, filho herdeiro desta Condessa da Feira, herdou sua casa, e foi Oitavo Conde da Feira; casou com D. Maria de Faro, filha herdeira de D. Francisco de Faro, Conde de Odemira, de quem não teve filhos, por morrer muito moço.
- Dom Fernando Forjaz Pereira Pimentel, filho segundo da sobredita Condessa Dona Joana Pereira, e irmão deste Conde Dom João Pereira Forjaz, foi Nono Conde da Feira: casou com D. Vecencia Luísa Henriques, sua prima, filha herdeira de Pedro César de Menezes, e de D. Guiomar, da qual não teve filhos.
Morrendo o último Conde da Feira, D. Fernando Forjaz Pereira Pimentel, em 1700, sem descendentes, foram os bens da Casa da Feira, integrados na Casa do Infantado, por ordem de D. Pedro II. A Casa do Infantado, era por norma, atribuída aos segundos filhos dos reis, o que veio a acontecer, com D. João V, em 10 de Fevereiro de 1708, ao atribuir ao seu irmão, o Infante D. Francisco, a doação do Condado da Feira.
À Casa do Infantado, passaram a pertencer as terras da Comarca da Feira, que eram: Vila da Feira, Vila de Oliveira de Azeméis (desanexada da Feira em 1799); Vilas de: Ovar, Macieira de Cambra, Castanheira do Vouga, Pereira Jusã e Couto de Cortegaça. Pertenciam ainda à Comarca da Feira, o Couto de Cucujães, o Couto de Sandim e de Crestuma. Até à extinção dos Coutos em 1692/1700, eram da jurisdição do Conde da Feira.

O CASTELO DA FEIRA
O Dr. Vaz Ferreira, diz-nos que foi no Castelo da Feira, que nasceu Portugal. Efectivamente, consultando-se a «Chronica Del Rei Dom Afonso Henriquez», de Duarte Nunes de Leão, lá se encontra o Castelo da Feira e o de Neiva, a contribuírem com as suas gentes, para o apoio ao jovem Príncipe Afonso, na luta que travou com os partidários da sua mãe D. Teresa. Individualidades como, Mem Lucídio e Ermígio Moniz (Séc. XI-XII), pertencentes a estas Terras de Santa Maria, lá estavam nas hostes de D. Afonso Henriques. Como atrás já referi (Terras de Santa Maria), muitas personalidades importantes passaram pelo Castelo, e, muita coisa está escrito digna de registo. Não posso deixar de aconselhar a leitura de, “Castelo da Feira – Onde Nasceu Portugal”, do Dr. Vaz Ferreira, em separatas do Arquivo do Distrito de Aveiro, vol. IV e V – 1939 e vol. VI – 1940. Também já mencionei em Terras de Santa Maria, a figura do Dr. Aguiar Cardoso, que em conjunto com Dr. Vaz Ferreira, acérrimos defensores do Castelo da Feira, nos deixaram um «Guia do Visitante» - Feira 1950, que nos faz uma descrição sucinta do monumento, bem como de parte da sua história.
Por simples curiosidade, e, porque talvez seja uma das facetas menos conhecidas, que estão relacionadas com o Castelo da Feira, aqui fica uma das personalidades a quem pertenceu: a Rainha Santa Isabel, esposa do nosso Rei D. Dinis. Foi aqui que a Rainha Santa Isabel, teve uma intervenção, na resolução das desavenças entre o Rei, seu marido, e o filho de ambos, o Infante D. Afonso, que se tinha apoderado do Castelo.
Também no reinado de D. Fernando, e quando da sua morte, a Rainha D. Leonor de Teles, governava o Reino e nas lutas que se travaram, para a sucessão ao trono, o Castelo foi conquistado aos partidários da Rainha D. Leonor, por D. Gonçalo Coutinho, colocando-o ao serviço do Mestre de Aviz (D. João I).
Em 1580 é do castelo da Feira, que o Rei D. António, prior do Crato, utiliza o seu armamento, e, com os nobres soldados de Santa Maria, avança, sobre Aveiro, que não acatava as suas ordens.
É um dos seus Condes (o sexto), D. João Pereira Forjaz, que devido à sua valentia, foi General da Armada e Viso-Rei da Índia.
Por tudo isto, não se pode falar, de qualquer parcela, do território das Terras de Santa Maria, sem se mencionar o Castelo, as suas gentes e os seus Condes, até à extinção do Condado. Contudo, não se livrou de um quase total abandono, e, em 1915 estava de tal maneira, que numa carta dirigida ao Presidente do Conselho de Arte e Arqueologia (2ª Circunscrição) Coimbra, em 15 de Maio, o Engº Paulo de Barros, expunha as sua razões, para se efectuar rapidamente uma intervenção, nos seguintes moldes:
«…Seria uma verdadeira e irreparável perda nacional, que, certamente, os tempos modernos não fariam ressurgir, por diferentes os moldes em que hoje se fundam as suas concepções, por mais brilhantes que elas sejam no seu caminhar constante de progresso, e por mais Formosas que se inscrevem neste ideal de Arte, que a sua evolução vem desenhando em cada dia no brilho, é verdade, de espíritos de incontestável merecimento. O que nos cumpre, portanto, é salvar este precioso património que o passado entregou à nossa guarda, como uma das jóias mais mimosas que se prendem às páginas mais heróicas da história de antigos portugueses, que tanto honraram esta pátria. É um sagrado dever que as gerações modernas têm de cumprir, sob pena de tombarem na sua decadência moral, que o desprezo pela Arte nunca poderá levantar, antes tracejará para sempre um título de ignomínia. …É serviço este de tamanha grandeza de acção para a salvação d’aquele histórico Castelo, que os velhos Condes da Feira ergueram com um brilho e majestade, que o tempo ainda não apagou, apesar do criminoso abandono a que foi lançado em princípios do século XVIII, pela extinta Casa do Infantado ao apagar-se a sucessão daqueles velhos fidalgos, e que mais se agravou em 1834, que muito enaltecerá o praticá-lo este ilustre Conselho de Arte, ajuntando a outros muitos, que honram a sua vida de dedicação e amor pela Arte Nacional

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