terça-feira, 7 de janeiro de 2014

CONTRIBUTO PARA A HISTÓRIA DE PAÇOS DE BRANDÃO

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A TRADIÇÃO NA HISTÓRIA


    Quando andava nos bancos do liceu, ensinaram-me que havia uma diferença muito grande entre as leis históricas e as das leis físico-naturais. O cientista limita-se a descobrir as relações constantes entre os fenómenos que observou, traduzindo-as em leis. O historiador tenta compreender o particularismo dos factos passados, num esforço para se libertar do seu próprio condicionalismo como sujeito moral e político que sempre é.

   Na História, o acontecimento é único, não se repete. Não é portanto uma «ciência exacta», porque não pode prever as diferentes modalidades que os factos futuros podem revestir, mas pode chegar a leis de carácter estatístico, servindo-se da história comparada.

   A síntese histórica, consiste, não só na reconstituição dos factos, mas no estabelecimento das suas relações causais. O verdadeiro historiador não é o que descreve, mas o que interpreta e compreende. Ora, só podemos compreender o acontecimento integrando-o numa síntese ordenada e inteligente. O facto é singular  mas tem infinitos liames a liga-lo ao passado e ao futuro. Estará a história subordinada ao princípio da causalidade?

   O bom historiador é aquele que, na vasta teia dos acontecimentos, vai destrinçar os fios da complexidade causal para indicar os que desempenharam o papel de mais relevo num dado fenómeno.

   A História deve ter uma narração verídica dos factos; uma narração que obedeça a uma informação verdadeira, certa, exacta, não fazer parte de qualquer pensamento mítico. Muitos escritores, falam do que merecia calar-se e calam o de que era necessário falar-se, o que se reverte numa ausência de espírito crítico nas suas narrações.

   Um facto histórico não pode ser observado directamente. Ele pertence ao pretérito…Fica, contudo, ao historiador a possibilidade de reconstruir mentalmente o acontecimento, de fazer a história buscando os factos (factum, feito). Para tal, ele tem de se socorrer dos documentos, isto é, dos traços presentes deixados pela acção do homem. Mas estes traços nem sempre são verdadeiros, nem sempre apresentam uma visão total do fenómeno a que parecem ligados. Sem documentos não se pode fazer história, mas só com eles a história não ganha autonomia de verdadeira ciência. Os documentos necessitam de ser iluminados pela crítica. Esta vai discernir o verdadeiro do falso, o provável do ilusório, o certo do duvidoso.

   Autores há que em virtude do seu subjectivismo, convicções políticas, morais, familiares, etc., se deixaram, inconscientemente levar pelo condicionalismo do seu nascimento, relatando um aspecto dos acontecimentos, aquele que mais interessava aos seus interesses particulares. A verdade histórica foi esquecida e os factos que nos apontam como verdadeiros, são escudados por uma possível «tradição popular», sem nos apresentarem qualquer prova documental que confirmem tal facto.

   Para terminar lembro que a Cultura é fruto de um trabalho de elaboração pessoal, ela não se herda espontaneamente, mas adquire-se por um esforço livre e consciente. Como diz Langevin (Écrits Philosophique et Pédagogiques, Paris,  1947), a cultura geral é «o que torna o homem aberto a tudo o que não é ele, a tudo o que ultrapassa o círculo estreito  da sua especialidade.»

  Por último lembro que chama-se tradição a transmissão dos testemunhos feita oralmente, e fixada ulteriormente por meio de monumentos ou escritos. Toda na narração, escrita mais de século depois do acontecimento, pode considerar-se tradicional.

   É sem dúvida este modo de transmissão o mais exposto a alterações e exageros; devemos pois conceder que se deve sujeitar a crítica mais rigorosa. Quanto às regras para apreciar o valor duma tradição, é preciso assegurarmo-nos:

a)      – De que os factos que constituem o seu objectivo são de importância excepcional; porque geralmente a tradição só vale para os sucessos capazes de impressionar  vivamente o espírito dos povos;
b)      -  De que é  ininterrupta; porque a tradição histórica só tem valor quando lhe podemos seguir o rasto até às testemunhas oculares;
c)      – De que é uniforme ao menos nas suas linhas gerais, e não variou nos diferentes povos, de costumes e interesses diversos;
d)      – De que não contradizem os monumentos mais estáveis da história;
e)      – Se finalmente, num dado momento, esta tradição se recolheu nalguma obra, resta fazer a crítica desta obra, e ver o  grau de confiança que nos merece.

Obrigado pela Vossa atenção,
Paços de Brandão, 06 de Janeiro de 2014
Carlos Alberto Sequeira Varela

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