Por: Carlos Varela
Todos aqueles que se interessam por HISTÓRIA LOCAL, sabem muito bem, que é preciso obter informações
disseminadas por um conjunto de vestígios onde o espaço e as sociedades se
inscrevem.
Fazer investigação sobre História Local é um assunto bastante
complexo, mas ao mesmo tempo um passatempo delicioso, com as vantagens de se
dar a conhecer o que se encontra relacionado com a povoação a que dedicamos o
nosso estudo, neste caso, Paços de Brandão. Todos nós devíamos conhecer a
História da nossa terra, pois ela seria amada com mais consistência. Não se
julgue que é fácil, é preciso tempo, paciência, perseverança e coragem,
precisamente quando verificamos que os nossos dados não coincidem ou até
contradizem as verdades estabelecidas por algumas pessoas ou entidades.
Em História Local, tem que haver um rigor e honestidade
intelectual, não se pode «inventar», tem-se que se procurar documentos, que
sejam, depois de uma análise séria e com rigor, de suporte ao que propomos
levar ao conhecimento da comunidade paroquial.
Ao iniciar a publicação de alguns contributos para a História
de S. Cipriano de Paços de Brandão, escolhi o Livro das Campaínhas, referente
ao Mosteiro de São Salvador de Grijó, na promessa de que outros artigos me
levarão a tratar de outros «contributos», como o “Cartulário de Baio-Ferrado”,
que decerto, irão contribuir. para uma melhor compreensão das origens de Paços
de Brandão.
“O LIVRO DAS CAMPAÍNHAS” – Códice da
segunda metade do século XIV- MOSTEIRO DE SÃO SALVADOR DE GRIJÓ
A primeira questão que se põe é o porquê este Códice,
referente ao Mosteiro de São Salvador de Grijó, ser conhecido por “LIVRO DAS
CAMPAÍNHAS”?...As igrejas de que o Prior e Cónegos de Grijó eram padroeiros,
encontram-se assinaladas por pequenos sinos desenhados nas margens do livro,
dando assim origem à designação porque é conhecido.
Foi Torquato de Sousa Soares que investigou a identidade e
paradeiro do Livro das Campaínhas, tendo-o encontrado no Arquivo Distrital do
Porto. A sua transcrição paleográfica foi efectuada por Jorge de Alarcão,
publicada em 1986 pelo Gabinete de História e Arqueologia de Vila Nova de Gaia.
Qual o contributo deste livro para a história da freguesia de
S. Cipriano de Paços de Brandão?...Antes que mais, convém relembrar que este
Códice de Grijó se refere a bens de que aquele Mosteiro era padroeiro,
referente à segunda metade do século XIV. O
livro é uma acta de uma assembleia judiciária, reunida no Mosteiro em 29
de Junho de 1365. Lá são referidos o rol de propriedades, rendas e foros do
Mosteiro nesta freguesia, bem como à indicação de fidalgos naturais que aqui
possuíam bens. Passemos pois à sua descrição:
Mandamento de Saa e de Paaçoo
Rio Maior
«A pobra e o moinho que traz Joham Dominguez da quatro libras
e dous capoes.
Item Lourenço de Paaçoo traz dous cassaes em hum e da deles
trigo pella do ieerado treze quairas e son pella nova onze quaiiras e alqueire
e segunda cinquo quairas pella do eirado e son pella nova quatro quaiiras e da
por vinho e por foros seiis libras e dous soldos.
Item o cassal que traz Stevam Vicente da trigo oito quairas
pella do eirado e faz pella nova seiis quaiiras e dous alqueires e meio e
segunda pella nova quatro quairas e por vinho e por dinheiros de foros cinquo
libras e meia e hua galinha.
Item o cassal da Portella da duas libras.
Item a cassaria que traz Lourenço da de trigo pella nova huum
alqueire e meio.
Item o logar em que mora Domingos Lourenço da cinquo libras.
Item Domingos Antoninho do cassal em que mora da trigo pella
do eirado onze quaiiras e son pella nova oito quaiiras e três alqueires e de
segunda pella nova quatro quaiiras e por vinho e por foros de carnes de três
libras e hua galinha.
Item Gonçallo Martinz da do cassal em que mora com huum
moinho da trigo pella do eirado doze quaiiras e son pella nova nove quaiiras e
meia e segunda pella nova três quairas e alqueire e por vinho e foros de carnes
e pollo dicto moinho da sete libras e cinquo soldos.
Item na dicta aldeia jazem huas cassarias hermas.
Item a eigreja de Paaçoo a meatade do padroado he do dicto
moesteiro e da colheita ao priol que he posto por seiis libras.
Soma trigo dous moiios e cinquo quairas. Soma segunda quinze
quairas e alqueire. Soma dinheiros trinta e sete libras e dez e sete soldos. E
dous capoes e duas galinhas.»
ESTES SON OS NATURAES FIDALGOS QUE ORA O MOESTEIRO DE IGRIJOO
HÁ QUE ORA SON VYVOS
Joham Brandom e duas filhas.
Fernam Martinz sa irmaa.
Biringuella Diaz sua madre
É de assinalar que é a primeira vez que se encontram
assinalados, como fidalgos naturais de Grijó, personalidades que usam nos seus
nomes o apelido de «Brandom», quem eram estas personalidades é um assunto que
José Augusto P. de Sotto Mayor Pizarro, em “OS PATRONOS DO MOSTEIRO DE GRIJÓ”,
nos explica muito bem, como se segue:
«JOÃO MARTINS BRANDÃO e FERNÃO
MARTINS BRANDÃO eram filhos de Martim Brandão e de BERENGÁRIA DIAS DO AVELAR. O
Conde D. Pedro refere este casal afirmando que tiveram filhos e filhas, não
referindo porém os seus nomes. Quem fosse a mulher de João Martins ou o nome
dos seus filhos, é coisa que ignoramo».
«Dona BERENGÁRIA DIAS DO AVELAR, foi casada com Martim Brandão, e depois de
enviuvar casou com João Afonso de Sanir. O Conde D. Pedro afirma que do
primeiro matrimónio houve filhos e filhas, mas nós só conseguimos identificar
dois, que são referidos no Livro das Campaínhas:
João Martins, que segue:
Fernão Martins Brandão que foi alcaide do castelo de Arronches, por
carta de 1 de Janeiro de 1363. Em 1369 foi-lhe coutada a herdade de vale da
Arca, no termo de Montemor-o-Novo, morando ele em Évora. É possível que tenha
sido aio do Infante D. Fernando.
João Martins Brandão foi alcaide do castelo de Penamacor, por
carta de 1362. Estava já casado em 1351, com Leonor Esteves das Medas que era
também natural de Grijó, juntamente com seus irmãos e que não conseguimos
entroncar na família patronal. Leonor esteves aparece ainda em 1374, quando a
13 de Janeiro fez composição com o mosteiro de Paço de Sousa. Fez testamento em
1387, acrescentando-o em 1395 e nos dois favorecendo aquele mosteiro. No
testamento, para além de legados pios e certas obrigações de missas, pede para
ser enterrada junto a seu filho, Rui Brandão, fazendo ainda recomendações a sua
filha, para que faça cumprir as suas vontades. O Livro das Campainhas omite o casamento referido, afirmando apenas a
naturalidade a João Brandão e duas
filhas, para além do irmão e mãe. Do casamento com Leonor Esteves nasceram:
RUI ANES BRANDÃO, talvez até já falecido em 1365, e que à
data do testamento de sua mães, estava sepultado com seu pai em Paços de Sousa.
BERENGÁRIA DIAS BRANDÃO.
N. (ANES) BRANDÃO.»
Em complemento ao que ficou exposto, devemos recordar o que o
Conde D. Pedro, no “LIVRO DE LINHAGENS”, nos diz sobre os fidalgos naturais de
Grijó:
«E dona Moor Rodriguez
d’Urróo foy casada com Garçia Martiins
de Bramdom, e fez em ella Pero
Garçia, e Joham Garçia, e Fernam Garçia: e estes todos foram caualeiros de
huum escudo e de huma lança e nom de gram fazemda»
Voltando a José Pizarro, verificamos que a influência destes
fidalgos, a nível local seria, porventura, bem maior que a dos ricos-homens,
geralmente fixados na corte e tendo as suas terras administradas por
dependentes de confiança. Estes cavaleiros-escudeiros, os bens que detinham e
que, provavelmente, administravam directamente não deviam ser muito extensos, mas
a sua influência a nível local, seria muito considerável.
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