quarta-feira, 22 de maio de 2013

Carlos Varela - POESIA TROVADORESCA



POESIA TROVADORESCA

Antes de apresentar qualquer descrição do que foi considerado a “Poesia Trovadoresca”, noção abrangente da “tradição lírica peninsular” , de os mais antigos textos literários (cantigas de amigo; cantigas de amor; cantigas satíricas), bem como do âmbito cronológico (1198-1354), dividido em ciclo afonsino (1198-1279) e ciclo dionísico (1279-1354), convém dar uma explicação do uso de alguns termos, em uso neste período da nossa literatura, para isso, nada melhor do consultar, um livro já com alguns anos (a 3ª edição é de 1948), do Padre Arlindo Ribeiro da Cunha, “A LÍNGUA E A LITERATURA PORTUGUESA”, e, podem estar cientes disso, é , ainda hoje, dos melhores compêndios de História da Literatura Portuguesa:

TROVADOR – termo que geralmente se considera derivado, ou ao menos cognato, do provençal trobar e do francês trouver, encontrar. Era o nome dado ao poeta, quase sempre filho d’ algo, que compunha, encontrava, a letra e a música de canções amorosas ou satíricas. Era um poeta, em geral, culto e não executante.

JOGRAL – Em provençal, joglar, do latim ioculare, brincar, zombar. Era um cantor e tangedor ambulante, que ia de Corte em Corte, da castelo em castelo ou de um santuário em santuário, a executar versos, quase sempre alheios. Geralmente de origem plebeia, fazia da arte uma profissão remunerada, e, nos tempos mais antigos, também o papel de histrião. A palavra joglar é documentada muito antes que a de trovador.

SEGREL – dissimilação de segrer [provençal segrier, derivado de segre, segle(saeculum)]. Chamava-se-lhe também jogral da Corte. Era trovador profissional, fidalgo de baixa patente ou desqualificado, que ia de Corte em Corte, a cavalo, acompanhado do seu jogral. Parece insustentável a doutrina dos que fazem derivar a forma portuguesa da provençal, e esta directamente do adjectivo segliér, formado do árabe zejjel,canção com estribilho.

MENESTREL – do homónimo francês que provém do latim ministerialis .A princípio era perfeitamente sinónimo de jogral. No século XIII, começou a designar músico – poeta sedentário, que vivia em casa dum Príncipe ou dum fidalgo; ao passo que o jogral andava de terra em terra.

SOLDADEIRA – Era uma espécie de jogralesa, quase sempre de moral rasteira, que servida duma criada, acompanhava os segréis e jograis nas excursões artísticas. Cantava e dançava por ofício, mas algumas figuram nas cantigas como tangedoras. O nome por que eram conhecidas veio-lhes do soldo que recebiam.

POESIA – do verbo grego poiéo fazer, compor, é o género literário que exprime o belo por meio da palavra rítmica. Como ainda hoje nos bailados, o termo poesia designava também a música e a dança, as três artes do ritmo. Poeta era o nome que se dava ao compositor da letra.

LIRISMO – é a expressão poética e espontânea dum sentimento individual sincero. As composições desta natureza costumavam-se executar ao som da lira, donde o nome do género poético.

O PRIMITIVO LIRISMO - Desde muito cedo no noroeste da Península, ainda antes de se constituir a nacionalidade portuguesa, já aí florescia uma literatura especial, em vernáculo, que depressa se desenvolveu e aperfeiçoou, a ponto de exercer influência em toda a Espanha e mais além.

Não chegaram até nós monumentos literários desse tempo, mas os exemplares que possuímos dos Séculos XII e XIII permitem-nos formar ideia bastante exacta dessa literatura. Trata-se dum lirismo composto com o fim de ser cantado ao som da cítola ou da tiorba e muitas vezes sob o compasso da dança.

Era uma poesia de carácter feminino. As gráceis e graciosas donzelas de então, cheias de cuidados pela sorte dos amigos que iam no fossado ou no ferido, carpiam a soledade que as amargurava, desabafando coitas de amor com uma irmã, de ordinário mais nova, uma companheira, ou com a própria mãe. Outras veszes a cantiga era um monólogo, um solilóquio, em que às ondas do mar de Vigo, aos cervos do monte ou às avezinhas das florestas se pediam novas do amigo ausente.

Este saudosismo amoroso, efeito presumível das condições históricas do tempo, comunicava à poesia um cunho acentuado de tristeza que se diz própria de gente celta.

A poesia de tais composições era um lirismo burgês, popular até, sem os estoicismos do coetesanismo provençal nem os frenéticos arrebatamentos das gestas da língua d’oil. Respira-se aqui o ambiente familiar, com um amor puro, humano e possível, frisante contraste com a afeição adúltera, pecaminosa, dos Franco-Provençais.

Os temas são pedidos à Natureza, a tudo se pede a volta do amigo, tudo se aproveita para conferir graça, pitoresco, encanto suavidade àquele género de poesias. A donzela é a que fala, a que se mostra enamorada e saudosa, ao contrário do sucedido com as poesias provençais, onde o amigo se fica extasiado perante a formosura da dona, que se não digna corresponder-lhe.

Parece, pois, que as mulheres foram na literatura galai-portuguesa as primeiras compositoras, como ainda hoje o são em muitas quadras de gosto popular.

Destinadas à execução, essas cantigas raras vezes se escreviam, não admirando, por consequência, se hajam perdido.  Mas ouviam-se em todo o norte e centro do País, na boca de raparigas solteiras, que labutavam no amanho dos campos, fiavam de noite ao serão, espadelavam o linho, embalavam o berço dos irmãos recém-nascidos, ou volteavam, em rítmicos movimentos coreográficos, no território das ermidas ou dos santuários aonde iam em romaria.

Entretanto, os amigos andavam a cosnstituir e a estender o território nacional, combatendo a moirama.

Em breve, porém, a literarura provençal invadiu a Península. Em Portugal e na Galiza, teve o mérito de despertar o gosto do amortecido lirismo nacional, polindo-o e tronando-o digno de aparecer na literatura escrita, ao mesmo tempo que nos comunicava a cantiga de amor e imprimia, com o sirvantés, forma literária à nossa ingénita propensão para a sátira e má língua.

Ficaram-nos assim três espécies de poesia, cujas colecções constituem os mais antigos textos literários de Portugal:
                                               Cantigas de amigo;
                                               Cantigas de amor;
                                               Cantigas de escárnio e de maldizer.

*Continua...

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